terça-feira, 29 de junho de 2010

viagem com Brasilino e Saramago

isto me faz lembrar do ano de 1972. Recém casado, fui com Palmira, minha companheira e mãe de meus filhos; à antiga aldeia das Mangabeiras (berço indígena do município de Ponta de Pedras, na ilha do Marajó). Queria que ela soubesse daquela minha origem nativa que misturada à dela com raízes africanas na Guiné (escravos importados no Nordeste) e no Marrocos (judeus sefardistas emigrados no Pará) iamos começar a nossa prole...

eu e minha mulher temos herança comum em Portugal e Espanha (região da Galícia) com pé no Marajó desde a segunda metade do século 17... Uma teia de avós analfabetos, todavia sábios tantos quantos os lembrados avós do premio Nobel de Literatura português.

Fui a Ponta de Pedras apresentar minha cara metade aos parentes marajoaras e, naturalmente ao meu velho e querido mestre da história oral daquela aldeia, BRASILINO RODRIGUES...

Ele no reizado do coqueiral na beira da baia do Marajó com a família (está na cara, mestiça de índios e degredados lusos) nos oferecia doce água de coco quando, de repente, sem nenhuma provocação recente de minha parte (noves fora, em outros tempos quando deixei rastros na estrada a pé para convencer aquela gente a formar cooperativa de pescadores e explicar o que seria "reforma agrária": vem daí, em plena ditadura, minha modesta fama de comunista a que estava condenado a ser quando não mais por outra coisa, por ser sobrinho de DALCÍDIO JURANDIR filho daquele município...) saiu-se o velho caboco filósofo de ocasião me dizendo assim, à guisa de incentivo ao novo casal visitante:

-- Zé, eu sou um homem feliz...
Eu olhei a minha mulher, dizendo-lhe: "Viste? O homem mais feliz da terra não tem uma camisa pra vestir..."

De fato, na canícula do lugar mestre Brasilino não havia ar condicionado nem ventilador (nem precisava, com a brisa do mar tranzendo da baía canoas com o peixe nosso de cada dia), bastava tirar a camisa, sacudir fora o calor e toda má idéia consumista capaz de estragar o prazer de uma vida decente.

há que se não confundir a nobre e orgulhosa pobreza de uma gente invencível, com a miséria que acovarda e corrompe a HUMANIDADE dos já pobres de espírito deste o nascimento...

Esta é a questão! Tupy or not Tupy...

O Nobel lusíada que me não atendeu o convite [cf. "Novíssima Viagem Filosófica": Belém, 1999] para vir ao Marajó espiar o pisão iluminista do Diretório de Pombal, e, no entanto, levou consigo à Suécia nada menos que a parábola pastoril de parentes próximos do meu mestre Brasilino, os avós camponeses do Nobel da língua portuguesa.

quantos destes pobres avozinhos pastores de Portugal vieram cá enterrar seus ossos nas terras do Brasil procurado em sonhos no além mar? O imenso crime de lesa humanidade, praticado pelos ricos coloniais de lá e de cá, em nome de Deus e da Pátria contra os povos:

Divide e impera! (sentença romana), o povinho português e brasileiro jogados um contra o outro para glória de feitores dos monarcas usurpadores da felicidade alheia, infelizes e mesquinhos até o talo.

EIS QUE AINDA CARECE DESCOLONIZAR A LÍNGUA DE CAMÕES PARA FUNDAR DE FATO A LUSOFONIA INTERNACIONAL.

ave, Saramago no céu da memória lusitana!




Discurso de JOSÉ SARAMAGO na Academia Sueca
(ao receber o Prêmio Nobel de Literatura)


"O homem mais sábio que conheci em toda a minha vida
não sabia ler nem escrever. As quatro da madrugada, quando a promessa de um novo dia ainda vinha em terras de França, levantava-se da enxerga e saía para o campo, levando ao pasto a meia dúzia de porcas de
cuja fertilidade se alimentavam ele e a mulher. Viviam desta escassez os meus avós maternos, da pequena criação de porcos que, depois do desmame, eram vendidos aos vizinhos da aldeia. Azinhaga de seu nome, na província do Ribatejo.

Chamavam-se Jerónimo Melrinho e Josefa Caixinha esses avós, e eram analfabetos um e outro. No Inverno, quando o frio da noite apertava ao ponto de a água dos cântaros gelar dentro da casa, iam buscar às pocilgas os bácoros mais débeis e levavam-nos para a sua cama. Debaixo das mantas grosseiras, o calor dos humanos livrava os animaizinhos do enregelamento e salvava-os de uma morte certa. Ainda que fossem gente de bom caráter, não era por primores de alma compassiva que os dois velhos assim procediam: o que os preocupava, sem sentimentalismos nem retóricas, era proteger o seu ganha-pão, com a naturalidade de quem, para manter a vida, não aprendeu a pensar mais do que o indispensável.

Ajudei muitas vezes este meu avô Jerónimo nas suas andanças de pastor, cavei muitas vezes a terra do quintal anexo à casa e cortei lenha para o lume, muitas vezes, dando voltas e voltas à grande roda de ferro que acionava a bomba, fiz subir a água do poço comunitário e a transportei ao ombro, muitas vezes, às escondidas dos guardas das searas, fui com a minha avó, também pela madrugada, munidos de ancinho, panal e corda, a recolher nos restolhos a palha solta que depois haveria de servir para a cama do gado. E algumas vezes, em noites quentes de Verão, depois da ceia, meu avô me disse: "José, hoje vamos dormir os dois debaixo da figueira". Havia outras duas figueiras, mas aquela, certamente por ser a maior, por ser a mais antiga, por ser a de sempre, era, para toda as pessoas da casa, a figueira.
Mais ou menos por antonomásia, palavra erudita que só muitos anos depois viria a conhecer e a saber o que significava... No meio da paz noturna, entre os ramos altos da árvore, uma estrela aparecia-me, e depois, lentamente, escondia-se por trás de uma folha, e, olhando eu noutra direção, tal como um rio correndo em silêncio pelo céu côncavo, surgia a claridade opalescente da Via Láctea, o Caminho de Santiago, como ainda lhe chamávamos na aldeia.

Enquanto o sono não chegava, a noite povoava-se com as histórias e os casos que o meu avô ia contando: lendas, aparições, assombros, episódios singulares, mortes antigas, zaragatas de pau e pedra, palavras de antepassados, um incansável rumor de memórias que me mantinha desperto, ao mesmo tempo que suavemente me acalentava. Nunca pude saber se ele se calava quando se apercebia de que eu tinha adormecido, ou se continuava a falar para não deixar em meio a resposta à pergunta que invariavelmente lhe fazia nas pausas mais demoradas que ele calculadamente metia no relato: "E depois?". Talvez repetisse as histórias para si próprio, quer fosse para não as esquecer, quer fosse para as enriquecer com peripécias novas.

Naquela idade minha e naquele tempo de nós todos, nem será preciso dizer que eu imaginava que o meu avô Jerónimo era senhor de toda a ciência do mundo. Quando, à primeira luz da manhã, o canto dos pássaros me despertava, ele já não estava ali, tinha saído para o campo com os seus animais, deixando-me a dormir. Então levantava-me, dobrava a manta e, descalço (na aldeia andei sempre descalço até aos 14 anos), ainda com palhas agarradas ao cabelo, passava da parte cultivada do quintal para a outra onde se encontravam as pocilgas, ao lado da casa. Minha avó, já a pé antes do meu avô, punha-me na frente uma grande tigela de café com pedaços de pão e perguntava-me se tinha dormido bem. Se eu lhe contava algum mau sonho nascido das histórias do avô, ela sempre me tranqüilizava: "Não faças caso, em sonhos não há firmeza".

Pensava então que a minha avó, embora fosse também uma mulher muito sábia, não alcançava as alturas do meu avô, esse que, deitado debaixo da figueira, tendo ao lado o neto José, era capaz de pôr o universo em movimento apenas com duas palavras. Foi só muitos anos depois, quando o meu avô já se tinha ido deste mundo e eu era um homem feito, que vim a compreender que a avó, afinal, também acreditava em sonhos. Outra coisa não poderia significar que, estando ela sentada, uma noite, à porta da sua pobre casa, onde então vivia sozinha, a olhar as estrelas maiores e menores por cima da sua cabeça, tivesse dito estas palavras: "O mundo é tão bonito, e eu tenho tanta pena de morrer". Não disse medo de morrer, disse pena de morrer, como se a vida de pesado e contínuo trabalho que tinha sido a sua estivesse, naquele momento quase final, a receber a graça de uma suprema e derradeira despedida, a consolação da beleza revelada.
Estava sentada à porta de uma casa como não creio que tenha havido alguma outra no mundo porque nela viveu gente capaz de dormir com porcos como se fossem os seus próprios filhos, gente que tinha pena de ir-se da vida só porque o mundo era bonito, gente, e este foi o meu avô Jerónimo, pastor e contador de histórias, que, ao pressentir que a morte o vinha buscar, foi despedir-se das árvores do seu quintal, uma por uma, abraçando-se a elas e chorando porque sabia que não as tornaria a ver."

(por José Saramago)


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sábado, 19 de junho de 2010

Saudades da Terra: conflito, colonialismo e devastação na Amazônia [5, final].

Neste ofício, quem manda escrever é a necessidade. O grito a quebrar o silêncio na ilha da distância. Eu por mim não mando nadinha: tenho juízo de obedecer ao impulso vital que me chega ao cérebro e ao coração através do arco das gerações passadas, sempre ansiosas em abrir caminhos ao que há de ser. De todo modo, quem decide o que fazer, como e quando é o tal de acaso. O acaso, mais forte que o destino; mais miraculoso que um deus grego; leva ele a garrafa do náufrago à deriva para dar à praia onde bem entender. É claro que há neste jogo limitadas possibilidades, todas pendentes do dito cujo que um ingênuo acreditaria ser capricho do destino. Fica convencionado, para efeito de trégua entre a santa madre igreja católica apostólica romana e a patota dos amigos do ateu José Saramago, que onde se lê "Acaso" é lícito ler "Deus", ou vice-versa.

As saudades da terra geraram por meu pobre intermédio quatro prosapoesias postadas no sítio Vermelho (www.vermelho.com.br), eu havia resolvido encerrar com uma mais, que agora será esta. Entretanto, o texto pronto da quinta saudade se evaporou por acaso num bug de software e a maré de elétrons levou tudo ao fundo do abismo. Com mãos abanado, suspirei conformado: ainda bem que antes desta me lembrei do mito de Sísifo. Haja a fazer tudo de novo: nada estranho para quem vai dobrando a casa de 73 outubros e queria ser romancista aos 16 anos de idade... As saudades revividas chegaram até minha ilha imaginária a bordo do notebook, via internet, desde o seiscentismo das ilhas dos Açores, donde Gaspar Frutuoso coletou saudades alheias e suas para viajar no tempo e espaço até a notícia da ilha "Graciosa, refúgio paradisíaco", obra sentimental de Fernando Silva.

O acaso fez-me, então, o favor de mandar a garrafa do amigo português entregue à corrente desde o arquipélago dos Açores. Curiosa conexão da infinita correnteza de neurônios que liga vidas e vidas além da morte de muita gente deste e outros mundos! Graças a sensibilidade de Fernando Silva, ao buscar asilo a seus pesares na Graciosa, pude revisitar o passado e buscar descobrir no futuro novas ilhas Afortunadas, tal qual Gaspar Frutuoso um dia lavrou nos começos ultramarinos no nebuloso mar da lenda e pré-história das ilhas do Atlântico. Ora, é caso de que estamos todos e todas enlaçados no tempo... Morremos todos e ressuscitamos todos na vida e na morte de uns e dos outros.

Eu tinha necessidade de reescrever a quinta e última saudade da série, quando deu-se o acaso da morte ir a Lanzarote visitar José Saramago enfermo para lhe dizer, como anjo exterminador: basta, José; já viajaste muito e inventaste muitos roteiros de viagem e estórias. Agora chega de ser gente. Urge que voltes ao pó original para que teu pensamento livre de outras inquietações seja estrela do firmanento na rota memorial das velhas navegações para descobrimento das ilhas Afortunadas no mundo achado e por achar...

E se nada disto é verdade, por acaso da invenção e minha pena está dito aqui e agora com fé sebastianista da ressurreição natural da vida eterna enquanto dura. Embora a história nunca se repita e ninguém mergulha duas vezes no mesmo rio; não é menos verdade que o ir e vir da maré, o fluxo e refluxo das necessidades; ficam entregues ao acaso de sucessivas soluções e sucessivos problemas ad nauseum... Destarte a vida e a morte são duas faces da existência. Ao fim e ao cabo, se Deus não criou o homem, o homem criou a Deus na ingênua ambição da eternidade, esta criancice da mente. Não fosse a cegueira humana inventar e pintar o diabo: aqui a coisa muda de figura e o que era bem se torna mal... Exemplo geral, as Ilhas Afortunas foram causa de diveros infortúnios, a rica ilha do Brazil atraiu a pobreza da Europa e fez miséria no Novo Mundo; o tesouro do El Dorado fomentou o inferno verde no Novo Éden...

Culpa de quem? Da cegueira, diria prontamente o padre Antônio Vieira no "Sermão aos Peixes"... Se fosse o pecado original de Eva e Adão - a mulher porque deu "ouvidos" à mentira da Serpente e o homem porque não resistiu ao fruto oferecido - o Criador estaria encrencado perante qualquer juízo racional. Pois, os primeiros humanos eram inocentes como as plantas e os bichos do Éden ou dotados de razão e consciência não foram suficientemente instruídos sobre o perigo da explosão demográfica. Erro de planejamento cósmico? Impossível para um ser onisciente. Se Ele fizesse criaturas tão desvalidas assim para colocar toda culpa do universo sobre elas; não poderia ser misericordioso o Criador e deixar em dúvida nobres almas, tais como Madre Tereza de Calcutá, consumida na solidão...

Era preciso crer na vida além da própria vida para vencer a morte, tal qual no Evangelho segundo Jesus Cristo. Ou encarar a morte como condição absoluta da sucessão natural das coisas: acho eu que Saramago optou por este atalho da consciência, incansavelmente, sem se preocupar em ser simpático a ninguém nem poupar a qualquer tradição. Foi pois a "Viagem a Portugal" que me deu oportunidade de mandar minha garrafa de náufrago sob capa da "Revista Iberiana" [Belém-PA, Brasil, 1999] com título de "Novíssima Viagem Filosófica"...

A garrafa que não chegou a Lanzarote, por acaso andou de mão em mão mas muitos não a abriram e os que abriram não gostaram ou não entenderam a mensagem do viajante do roteiro do sábio Alexandre Rodrigues Ferreira, exceção de Paolo Carlucci que se tornou o maior divulgador do achado iberiano no rio das Amazonas e do professor Sergio Nunes, que logo viu na escrita caboca saída da floresta amazônica vestígios, como que miraculosos, da filosofia tardia de Giambattista Vico no século XXI... Melhor ainda: Fernando Silva acertou na mosca, quando adivinhou que por aí vai a prístima herança das Ilhas Afortunadas. A emendar, por acaso, o roteiro de Almeida Garret com a viagem filosófica ao Grão Pará, Rio Negro e Mato Grosso... Visita sentimental à chusma de vilas e lugares portugueses superpostos (à muque) sobre o chão de aldeias jesuíticas da invenção da Amazônia.

Posto que há muito a falar sobre terras e mares que Portugal descobriu é prudente ficar por aqui com as saudades antigas. Preparar a barca do sonho para outras aventuras com vistas a boa esperança da lusofonia transnacional até a volta triunfal do encoberto rei dom Sebastião. Ou seja, do reino de Deus baixado à terra humana. Grande invenção do Apocalypso pós-devastação da Amazônia! São José Saramago chanceler de Jesus Cristo na terra dos Tapuias, secretário de estado do Quinto Império do vasto mundo de Drummond; capital em Belém do Grão Pará onde a heresia dos índios fez levantar o Presépio com os turcos encantados, reis Magos, as tribos perdidas do cativeiro da Babilônia e do rio Babel sob protetorado celeste da santa mãe de Deus de Nazaré soberana do círio em Belém d'Amazônia...

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Saudades da Terra: conflito, colonialismo e devastação na Amazônia [4].

O nome e a invenção do Brasil.

A origem do nome “Brasil” deu margem a diversas hipóteses, antes de ser o país descoberto por Cabral batizou o Monte Brasil, no arquipélago dos Açores; donde passou ao Novo Mundo. O filólogo Adelino José da Silva Azevedo diz que se trata de palavra celta embora as origens mais remotas poderiam chegar aos fenícios, mercadores de um corante mineral vermelho extraído pelos celtas, povo minerador da Ibéria e Irlanda. Os gregos tomaram o lugar dos fenícios no comércio do produto que chamavam "kinnabar". Através do latim passou a "cinnabar" donde se chamou "cinábrio" em português e "cinabrio" em espanhol. Uma das características das línguas celtas é inverter as partículas, assim "kinnabar" passou a "barkino" e deu lugar a "barcino" aplicado a animais de pelo avermelhado, com variantes para designar a cor vermelha em diversas línguas tendo influência céltica.
Artesãos da Idade Média começaram a usar um corante vermelho extraído de madeira que, na Toscana, chamou-se "verzino", em Veneza "berziy" e em Génova "brazi". O nome logo foi usado para denominar também a madeira donde tal corante era extraído, conhecida na Espanha como "palo Brasil" ou "palo de Pernambuco", em Portugal "pau-brasil". Entre cronistas coloniais portugueses como João de Barros, Frei Vicente do Salvador ou Pêro de Magalhães Gandavo, há consenso sobre a origem do nome Brasil. Nos documentos só há uma versão, que é a do nome Brasil derivar do pau da tinta dito pau-brasil. Gandavo escreve que depois que o pau da tinta chegou a Portugal chamou-se de Brasil à colônia de Santa Cruz: "Chamaram de Brasil por ser vermelho e ter semelhança de brasa e daqui ficou esta terra com este nome de Brasil".
Na época os exploradores guardavam rigoroso segredo sobre lugares que achavam ou conquistavam, a fim de garantir privilégio de navegação e comércio. Assim se espalhou na Europa a notícia de que se havia achado certa "ilha do Brasil", no meio do oceano Atlântico, donde chegava o vermelho “brasil”. O gentílico "brasileiro" surgiu no século XVI, inicialmente apenas aos que faziam o mercado do pau-brasil. Só na primeira constituição brasileira, em 1824, "brasileiro" passou a designar oficialmente naturais do Brasil. Antes de "Brasil" as terras brasileiras descobertas em 1500 foram chamadas de Monte Pascoal, Terra dos Papagaios (designação popular), Ilha de Vera Cruz, Terra de Santa Cruz, Nova Lusitânia, Cabrália, etc. Os povos originais tupis chamavam ao país de Pindorama (terra das Palmeiras) e ao norte (Amazônia brasileira na atualidade) era chamado pelos mesmos de “Tapuya tetama” (terra dos Tapuias).
Do mesmo modo como na distância os navegadores viram, primeiramente, o “Monte Pascoal” antes de chegar à Ilha da Vera Cruz; também séculos antes eles viram primeiramente o “Monte Brasil” para depois achar as ilhas dos Açores... A “Ilha do Brazil” ou “Hy Brazil” era uma das ilhas míticas do Atlântico no ciclo de lendas de São Brandão, as Ilhas Afortunadas imaginadas ao extremo ocidente do velho mundo.
Cartografia do país do futuro.
José Saramago descreve como era sonho de qualquer Sancho Pança insone levantar cedo da cama para ir ao paço rogar licença de el-rei para navegar o Mar Oceano a fim descobrir uma ilha qualquer desconhecida, que nem um proletário desempregado anseia por acertar prêmio da loteria: saudade congênita de povos ribeirinhos... A cartografia medieval indica como a “Ilha do Brasil”, a Antília, a ilha de São Brandão, as Sete Cidades e as ilhas Afortunadas foram insistentemente procuradas na imensidão marítima. A ilha mítica do Brazil firma o topônimo muito antes de 1500 e invalida a teoria do pau-brasil. Não só a viagem secreta do cosmógrafo do rei (cartógrafo real) Duarte Pacheco Pereira (1498) ao Grão Pará para medições da linha de Tordesilhas (1494) e resguardo da costa do Brasil ainda encoberto; como a viagem de Vicente Pinzon (1500) ao Ceará já tinham acontecida antes do descobrimento de Pedro Álvares Cabral: na realidade o Brasil, como lugar mítico, já estava estabelecendo no vocabulário dos povos marítimos há séculos. E o país das Palmeiras é mais velho do que o jovem “país do Futuro”.
A busca da Ilha do Brazil foi uma fixação das navegações renascentistas do Atlântico. Desde muito antes de 1500, o Monte Brasil escalou na península em face da cidade de Angra, nos Açores. Depois se deslocou a sudoeste rumo ao mar das Caraíbas e depois foi ancorar no litoral do nosso Brasil de 500 anos. A palavra gaélica irlandesa é breazáil, ou simplesmente brazil, barcino ou bracino em castelhano; varzino ou brazino em português. Todos estes vocábulos têm significado geral de vermelho. Contudo é no gaélico irlandês onde permaneceu vivo o substrato celta. A palavra sobreviveu até ao século XVIII, como em O'Brasil dado a poema do irlandês Moore, sendo também referida pelo folclorista O'Flaherty. A origem da palavra gaélica O'Brazil é o celta Hy Breasil, que significa descendentes do vermelho, ou os do vermelho. Deste modo, o termo serviu de referência a fenícios e gregos que ao deixar o comércio de cinábrio com os celtas determinaram como o desaparecimento das ilhas míticas nas brumas do Mar Oceano. Em compensação, surgiu um povo afortunado e lendário que nunca mais voltou à Irlanda natal, para viver na paradisíaca “ilha do Brazil”, dentre o arquipélago imaginário da tradição de São Brandão.
Erupção do maravilhoso celta no além mar
Segundo Paulo Pereira, “Enciclopédia dos Lugares Mágicos de Portugal”, volume 8, Lisboa, 2006; a “ilha Brazil” transportada pelo imaginário celta decadente no continente europeu ressurge na cartografia náutica, desde o século XIII. Tem variantes do nome original e se localiza próximo a Irlanda donde vai para o meio do Oceano. Surgiu num velho mapa da Catalunha, de 1325 e 1330; no mapa de Dulcert de 1339, no dos irmãos Pizagani de 1375 e 1378; com o cartógrafo veneziano Andrea Bianco de 1436, citando o Mar dos Sargaços. A ilha ambicionada está no mapa veneziano Zuane Pizzigano e no de um anônimo de Weimar, ambos de 1424. Prova da fervura da demanda com que se achou o arquipélago dos Açores e as ilhas Antília, Satanazes, Saya e Ymana.
O historiador português Armando Cortesão formula a «hipotética eventualidade do conhecimento tardo-medieval dos Açores, do Atlântico Central, dos arquipélagos das Caraíbas ou Antilhas». Por aí também vai o descobrimento do continente americano pelos portugueses. As tais ilhas míticas do Atlântico aparecem na carta náutica do genovês Battista Beccario, onde as ilhas lendárias são claramente identificadas com os Açores reais, na expressão "ilhas nova ou recentemente descobertas". Também nas cartas de Bartolomeu Pareto (1455) e Gracioso Benincasa, de 1470 e 1482. Como «O'Brasil» é nome próprio irlandês; «Hy Bressail» ou «O Brazil» na acepção de «Ilha Afortunada»), «Brasil», «Bracil», «Bracir», são corruptelas da palavra original gaélica. Cartografia delirante de ilhas como a dos Demônios; Avalon, a lenda do rei arthur, ilha de são Brandão, Drogio, Emparedada, Estotiland e Grocelandia. A Ilha do Brazil foi procurada com esperança, inclusive pelo polêmico Cristóvão Colombo, comenta Paulo Pereira.
Os portugueses tirando da imaginação deram nome da “Ilha Brazil” à ilha península que se conhece nos Açores como Ilha Terceira, onde existe o Monte Brasil. Indaga aquele autor: «De resto, porque se chamaria àquela madeira pau-brasil, se a palabra brasil não tivesse um significado mítico, ligado com certeza às brasas, porque assim o admite a etimologia céltica e germânica de Renan”. Com apenas 2.400 km² de superfície o arquipélago dos Açores descobertos em 1427 por Diogo de Silves, piloto de el-rei de Portugal; foi o primeiro “Brasil” que encobriu o caminho marítimo para as Índias: primeiro passo para o Descobrimento. A Escola de Sagres servindo de capa às maquinações secretas de mercadores de Veneza e navegadores de Gênova. O golpe de Cristóvão Colombo apenas coloca Castela na corrida e eleva as tensões entre latinos e germânicos.
As explorações seguras dos portugueses começaram pela ilha da Madeira e Porto Santo para chegar à ilha de Santa Maria. Até o ano de 1439 foram descobertas 7 das 9 ilhas dos Açores: Santa Maria (127 km²), Terceira (406 km²), São Jorge (244 km²), Faial (172 km²), Pico (441 km²), São Miguel (760 km²) e Graciosa (62 km²). As outras, Flores (164 km²) e Corvo (16 km²), foram depois descobertas por Diogo de Teive, um escudeiro do Infante Dom Henrique, em 1452. A povoação das ilhas se fez a partir de 1439, por ordem do rei dom Afonso que encarregou seu tio, o Infante dom Henrique, a povoar as ilhas distantes para produção de trigo que escasseava no continente e já era raro na Madeira; a exploração comercial e apoio às frotas no seu regresso da África, Extremo Oriente e, mais tarde, do Brasil. Com escassez de população em Portugal, o povoamento das ilhas do atlântico foi imperativo para servir de base a futuras descobertas com aspiração máxima de chegar às Índias.

terça-feira, 1 de junho de 2010

Saudades da Terra: conflito, colonialismo e devastação na Amazônia [3]

As ilhas atlânticas na base de construção do Brasil

A fim de ilustrar a presente série de artigos tomamos título emprestado da obra seiscentista “As Saudades da Terra” de autoria de Gaspar Frutuoso sobre o arquipélago dos Açores, ilha da Madeira e Canárias, acrescida de notas sobre Cabo Verde e outras regiões do Atlântico Sul. O significado das ilhas atlânticas na formação cultural e política do Brasil, incluindo a invenção da Amazônia; é sumamente importante. Entretanto, o Brasil moderno esquece a contribuição dos ilhéus na colonização portuguesa. Dependemos muitíssimo do Mar Territorial brasileiro e muitas vezes olvidamos o Mar-Oceano dos começos de nossa história.

Daí que para vir aos dias da devastação do meio ambiente nas regiões, inventar o país do futuro que desejamos deixar às futuras gerações e que não fique só na saudade do “paraíso perdido”; nós vamos à pinceladas recordando o passado aqui e acolá para explicar alguma coisa de nossos bons e maus usos e costumes herdados de além mar. A obra saudosista de Gaspar Frutuoso versa sobre história, geografia, usos e costumes das ilhas atlânticas nos inícios do século XVII. Mesmo tempo dos começos da colonização do Maranhão e Grão Pará (Amazônia lusitana), como se sabe, separada do estado-colônia do Brasil. O público brasileiro em geral não lembra, ou simplesmente não sabe, que a Amazônia foi colônia de Portugal separada do Brasil, desde a tomada do Maranhão (1615) até a Adesão à Independência (1823). Mesmo durante o tempo em que a corte real portuguesa esteve no Rio de Janeiro (1808-1821) a subordinação econômica da segunda colônia portuguesa na América do Sul ao continente europeu permaneceu inalterada, embora formal e administrativamente dependente da sede do reino no Brasil.

Em breve vamos completar, entre 2015 e 2016, 400 anos da tomada do Maranhão e fundação de Belém do Grão Pará. Por coincidência em 2015 termina o prazo estabelecido pela ONU das chamadas metas do Milênio. Ótima oportunidade para rever o passado e cogitar acerca do avenir. Falamos das saudades de Portugal continental e nos esquecemos, muitas vezes, das especifidades da Madeira, dos Açores e Cabo Verde. As ilhas que foram escalas dos caminhos marítimos e abriram as portas de África e esconderam a lendária “ilha” do “Brazyl” – chave das navegações para as Índias orientais – , até as naus de Sagres fundearem no distante país das especiarias e dos marajás.

Gaspar Frutuoso fez manuscrito da referida, com diversas emendas de próprio punho, mas não publicou a obra talvez devido à ocupação espanhola. O manuscrito fazendo parte da biblioteca do escritor foi doada ao Colégio dos Jesuítas de Ponta Delegada, onde ficou até 1760. Ano da expulsão dos Jesuítas de Portugal. O manuscrito foi levado por particulares que o doaram à Junta Geral de Ponta Delgada e incorporado à Biblioteca e Arquivo Público de Ponta Delgada. A obra foi publicada em 1873. Existem várias edições parciais e integrais das Saudades da Terra. Como outras literaturas das ilhas do Atlântico obras como esta possibilitam ao leitor brasileiro compreender retrospectivamente a invenção do Brasil de fora para dentro e, por outra parte, confrontar a pré-história oceânica com os primórdios das regiões do gigante Brasil.

Pré-história dos descobrimentos marítimos

A idade média foi mais do que a simples queda do império de Roma e fim da antiguidade. Ela foi também a perda do comércio das antigas rotas entre o Oriente e Ocidente, deste modo o conhecimento de terras a oeste da Europa foi, pouco a pouco, constituindo o reino do mito. As lendas medievais da Atlântida, das sete cidades, das terras de São Brandão, as ilhas Afortunadas, a ilha do Brazyl, a Antília, as Ilhas Azuis, Terra dos Bacalhaus, e muitas outras terras imaginárias ou reais perdidas no Mar Oceano são reminiscências daquele conhecimento difuso, cheio de incerteza, mas contante dos contos e das aventuras das sociedades medievais atraídas para além do horizonte e das praias do Atlântico encantador e aterrorizante a um só tempo.

É esta saudade congênita de povos ribeirinhos e insulares que acalentou os primórdios do Brasil. Na Europa, na última metade do século XIV, a especulação intelectual e novidades e tecnológicas que anteciparam a Renascença, fomentam roteiros e cartas de marear onde aparecem dentre a pletora de fantasias muitas dessas ilhas e terras. A febre de conhecimento geográfico retoma contatos comerciais e renova as navegações entre o mar Mediterrâneo e o oceano Atlântico com mercadores genoveses, florentinos e venezianos. Surgem melhores navios e o fervor da expansão do cristianismo para além da Europa, movimento de expansão dos horizontes europeus recriando antigas ligações. Ou seja, a velha pulsão imperial no quadro de um outro tempo gerando o espaço geopolítico.

Não precisa dizer que é preciso perder algo muito valioso para desejar refazê-lo ou o reencontrar. Portugal participa desse movimento expansivista, graças à sua geografia. Com que atraiu capitais e novidades técnicas levando a crescente mestria nas artes da construção naval e da navegação oceânica. Evidentemente, o capital da imaginação gerou o fundo mitológico que não deve ser desprezado na procura das ilhas do mar ocidental, tornando-se rapidamente em decisão prioritária de um poderosa vontade coletiva. Surge assim a legenda do Infante dom Henrique assumindo papel de grande mecenas e autarca da empresa de descobrimento do caminho das Índias, de modo decisivo para tirar Portugal de seu confinamento na esquina do Mediterrâneo com o Atlântico e passar à vanguarda da ocupação e povoamento das ilhas e terras atlânticas.

A Macaronésia, conjunto de ilhas atlânticas próximas à Península Ibérica formada pelo arquipélago dos Açores, Canárias e Madeira, tem raízes nas míticas ilhas Afortunadas imaginadas como unidade geográfica numa historiografia de povoamento comum onde as mesmas famílias aparecem por todas as ilhas: são originalmente os Bettencourt, os Câmara, os Álamo, os Baldaia e muitos outros que povoaram o Brasil, a partir do Maranhão, Pará, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. É disto que trata a obra seminal do historiador açoriano Gaspar Frutuoso, as Saudades da Terra, e serve de exemplo para procurar saber mais das ilhas do Atlântico na formação do Brasil.

Dizem comentaristas da obra, que as primeiras ilhas aparecem na literatura oficial por voltas de 1291: convém lembrar que por esta data o Brasil estava bastante povoado de diversos povos falando milhares de línguas diferentes, tais como as antigas ilhas Molucas (no atual arquipélago da Indonésia), que foram modernizadas sob a civilização islâmica, mas continuam falando lá a sua babel entendendo-se geralmente em inglês, como os brasileiros monoglotas em português do Oiapoque ao Chuí. Na Amazônia, a emblemática Cultura Marajoara havia atingido seu apogeu e os invasores Aruãs vindos das Guianas começavam a dominar as ilhas do Marajó, para estabelecer uma certa cronologia entre as diversas ilhas atlânticas das respectivas margens e do meio do Oceano.

O nome Brasil passou pelos Açores antes de desembarcar em Porto Seguro

As ilhas Afortunadas cederam espaço na imaginação dos nautas para dar lugar as Canárias (“terra dos cães), dizem que por ser as únicas habitadas na periferia europeia e dado grande número de cães que teriam se reproduzidos a partir de expedição enviada pelo rei Juba II da Mauritânia, no século I. Em 1402, os normandos Jean de Bettencourt e Gadifer de la Salle, a serviço do reino de Castela subjugam as populações nativas e iniciaram a dominação dos guanches (paleo bérberes), num genocídio que se completou em quase um século. Vestibular da conquista e destruição das Índias Ocidentais, com a conquista das últimas populações de Tenerife em 1496. Com o descobrimento da América (1492), a soberania das ilhas Canárias passou a ser disputada por Castela e Portugal, e acaba a contenda sendo objeto de arbitragem do estado do Vaticano a favor de Castela, posse reconhecida pelo rei dom Afonso V de Portugal no tratado de Alcáçovas, colocando fim à guerra da sucessão do reino de Castela.

Surgem, então, as primeira referências às ilhas da Madeira e Porto Santo, em 1418, ocupadas pelos portugueses e, finalmente, os primeiros contatos com os Açores, em 1427. O nacionalismo luso reclama a primazia do descobrimento dos Açores. Sabe-se que as ilhas dos Açores eram desabitadas, há indícios de que as ilhas já eram conhecidas ou pelo menos suspeitavam-se da existência delas, pois o Infante dom Henrique mandou achar as ilhas. A linguagem é própria da historiografia portuguesa, que diferencia “descobrimento” como revelação de terras achadas todavia de direito incerto e “achamento”; encontro do que se procura ou topa por acaso. Para mandar achar parece que existe probabilidade de encontrar. Os pesquisadores dos Açores referem-se a diversos vestígios que apontam a passagens de navegadores antes do povoamento. Outro problema é o nome Açores. Na antiga cartografia as ilhas eram identificadas como as "Ilhas Afortunadas" ou como "Ilhas de São Brandão". Atualmente, admitem-se que a toponímia vem da presença de aves identificadas pelos marinheiros portugueses como pertencentes à espécie de falconídeos do continente. Esta informação é criticada com base em que a única ave de rapina até hoje no arquipélago é o milhafre ("Buteo buteo rotschildi"), aparentemente, de recente introdução já que a ecologia das ilhas lhes era claramente desfavorável: o milhafre prefere como alimento pequenos mamíferos, os quais não existiam ao tempo do povoamento (os únicos mamíferos nativos são minúsculos morcegos).

A hipótese de que a toponímia das ilhas se deve à devoção religiosa do colono Gonçalo Velho a Santa Maria dos Açores, padroeira da freguesia de Açores, em Celorico da Beira (Portugal continental); está ganhando adeptos. Por último, poderia ser aportuguesamento do dialeto genovês ou florentino de “azzurre” ou “azzorre” correspondente às lendárias Ilhas Azuis; sugestão, dizem autores portugueses, da tonalidade verde azulada da vegetação nativa dos Açores. A paisagem mítica não se sobrepôs apenas ao nome do arquipélago. Em São Miguel e no Pico há povoados ditos as Sete Cidades, nome mítico que passou também ao Piauí (parque nacional das Sete Cidades); na Terceira, a península do Monte Brasil com registo anterior a 1500, certifica a mítica ilha do O’Brasil, ou Breasil, dos celtas irlandeses testemunha o nome que antes de chegar ao Brasil passou pelos Açores; ou os Mosteiros (da tradição de São Brandão) presentes na ilha de São Miguel e nas Flores, para além de Cabo Verde.

A partir da década de 1420, navios de Gonçalo Velho Cabral, Diogo de Silves e outros, com autorização prévia ou não, começaram a abordar e explorar os Açores. As ilhas mais ocidentais das Flores e Corvo só foram visitada depois de 1450, quando as mais ilhas já tinham razoável população, sua entrada no domínio lusíada deu-se, em 1452, durante viagem de Pedro Vazquez de la Frontera e Diogo de Teive no regresso de procura das outras ilhas míticas, ou talvez de uma pescaria na Terra dos Bacalhaus (atual Terra Nova, Canadá). Além do reconhecimento das costas e lugares de porto seguro para fazer aguada, se destinaram a lançar vacas, ovelhas, cabras, porcos e galinhas que pudessem se aclimatar e reproduzir para sustento de futuro povoamento. Em São Miguel há referência a um grupo de escravos deixados na foz da Ribeira da Povoação, cerca da metade da década de 1430. A colonização deu-se pela ilha de Santa Maria, primeira povoação, atual Vila do Porto na baía onde desaguavam duas ribeiras de águas cristalinas, só resta uma agora depois que a desflorestação da ilha alterou o meio ambiente original.

No começo da década de 1440 as colônias na foz das ribeiras de São Miguel, da Terceira, do Faial e talvez do Pico sustentavam-se da caça de aves e dos animais domésticos deixados a solta, além da pesca. A abundância de lenha e água, a fertilidade de solos vulcânicos, tornavam as ilhas fáceis de colonizar, tanto mais que a falta de trigo, que poderia ser facilmente cultivado, era constante em Portugal. As rochas de urzela, um valioso líquen tintureiro, deixava pensar na exploração econômica das ilhas e levaram ao rápido povoamento. Depois, desastres naturais, ataques de piratas e superpopulação e mudança do clima levaram à pobreza: os casais passariam ao imenso e “despovoado” Brasil. Um aventureiro chamado Simão Estácio da Silveira, patrão de navio, tira proveito da situação com um panfleto dedicado aos pobres de Portugal (leia-se Açores), em 1618, lhes prometendo o paraíso no Maranhão... Desamparados e famintos os pobres de Portugal roubaram as terras dos índios e os escravizaram. O Maranhão era terra do Bom Selvagem tupinambá, a resposta foi duríssima (uma centena de “portugueses” massacrados pelos índios) e a represália genocida não deixou margem a dúvidas do que viria mais tarde ainda